A fundação do município de Canguaretama ocorreu, segundo a historiografia tradicional, por causa de uma disputa pessoal entre dois políticos da região. Sobre esse assunto, Câmara Cascudo escreveu o seguinte: O padre José de Matos Silva, vigário de Vila Flor, desde 1846, era do Partido Conservador e zangou-se, ferozmente, com Sebastião Policarpo de Oliveira, senhor do engenho Juncal, do Partido Liberal.
Essa intriga deveria ter sua origem nas disputas políticas entre os dois partidos do Império. Padre Matos tentava, então, interromper o crescimento eleitoral de Sebastião Policarpo. Um modo rápido e eficaz seria transferir a sede municipal de Vila Flor para a povoação de Uruá, uma localidade isenta de influências partidárias . Como o Partido Conservador gozava do poder, a tarefa parecia fácil.
Dessa forma, em 1857, o projeto foi rapidamente aprovado pela Assembleia Provincial. A povoação do Uruá se transformaria na sede do município com a denominação de Vila de Canguaretama. A freguesia continuaria em Vila Flor até que a nova vila possuísse um templo decente. Para isso, o governo imperial arcaria com as despesas de construção de um templo religioso.
O presidente da província, Bernardo Machado da Costa Dória, recebeu o projeto para sanção em 20 de abril de 1857. Tinha sido empossado no cargo no início daquele mês e sua resposta foi dada nove dias depois, recusando. Ele pronunciou-se dizendo ser inconveniente essa transferência, pois Vila Flor já existia há muitos anos e não era prudente contrariar hábitos antigos, despertando rivalidades que sempre trazem desagradáveis consequências.
Muito contido, Costa Dória opinou que seria melhor a criação de uma nova vila do que uma transferência irrefletida e precipitada. Lembrou ainda que o projeto criaria uma despesa imediata de dois contos de Réis e, certamente, outras para o futuro.
O padre José de Matos , então, aguardou outra oportunidade, que não tardou muito. Em 19 de maio de 1858, Costa Dória deixou o cargo, mas ainda não era o momento . O padre esperou o outro presidente, Antônio Marcelino Nunes Gonçalves, tomar posse em 18 de junho de 1858. Essa era a oportunidade. Como presidente da Assembléia Provincial , o padre José de Matos Silva reenviou o projeto original, pedindo a sanção. Parecia combinado. Um mês depois de assumir o cargo, o novo presidente sancionou sem discutir e, talvez, sem fazer nenhuma leitura do projeto.
Dessa forma, entrou em vigor a Lei n° 367, de 19 de julho de 1858. Canguaretama passou a ser um dos municípios do Rio Grande do Norte. Vila Flor ficou reduzida à condição de simples povoação dentro do território que foi a sede durante 89 anos. O padre Matos deveria ter um imenso poder sobre todos os seus paroquianos, além de uma maioria inquestionável na Câmara de Vila Flor.
O escritor Luís da Câmara Cascudo dizia ter vasculhado o arquivo da Assembléia Provincial à procura de algum protesto contrário à transferência, mas não o encontrou. Com exceção de Sebastião Policarpo e de Costa Dória, não houve ninguém contra. Parece que todos estavam de acordo com a mudança.
A última sessão na Câmara Municipal da extinta Vila Flor aconteceu em 28 de agosto de 1858. A primeira sessão da Câmara na Vila de Canguaretama ocorreu no dia 18 de setembro do mesmo ano. Assim começou a história de um novo município do Rio Grande do Norte: Canguaretama.
Texto do livro "Povo dessa Terra" (2009) de Francisco Galvão.
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